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Transtorno de déficit de natureza

Foto do escritor: Evatania AzevedoEvatania Azevedo

Lucy... Um pouco de brilho no olhar


Diz a Lenda que em certos dias a natureza faz surgir novas crianças para pessoas adultas cuidarem por um certo tempo. Crianças precisam de aprendizados que só os adultos humanos podem proporcionar. No entanto, as relações de força e energia construtivas se dão através do caminho que se forma dentro de cada um de nós.

E assim nasceram, os personagens dessa história, Ana Beatriz, Paulo Cesar e Lucy, no mesmo dia e na mesma hora.

Ana Beatriz como uma princesa foi criada até seus 10 anos de idade, e nada lhe faltou..., ótima escola, bons cuidados médicos, excelentes brinquedos e tudo mais que uma família de classe média poderia proporcionar. Mas Ana Beatriz não era feliz.

Paulo Cesar nasceu em uma família com poucos recursos e foi criado com restrições de luxo, privilégios, poucos brinquedos, apoio médico e uma escola regular apenas para garantir o mínimo de uma convivência social. Paulo Cesar também não era uma criança feliz.

Até o dia que uma personagem exótica surge na vida dessas crianças. Seu visual atraente e único, cabelos soltos e ruivos, seu vestido verde brilhante e lindas pulseiras de prata. Ela se chamava Luciana, Lucy para os íntimos, com seus 10 anos de idade era bastante independente, sabia o que vestir, o que comer, como, quando e onde ir. Lucy era encantadora em suas conversas e canções. Sabia ler, dançar e pintar, e gostava muito disso.

Ana Beatriz conheceu Lucy numa noite muito quente de verão e ambas se tornaram grandes amigas.

Lucy chegou e foi logo simplificando o nome da menina. ABI seria seu nome de agora em diante. Ana Beatriz era o nome que sua mãe lhe chamava desde sempre, mas ela adorou ter um outro nome mais curtinho, naquele encontro ABI e Lucy puderam conversar sobre tudo a noite inteira.

Quando ABI acordou, Lucy não estava ali, mas sua energia boa de alegria e felicidade perfumava o ar e isso bastou para ABI ter um dia cheio de entusiasmo.

Durante o dia ABI ainda pensou em sua amiga dos sonhos, mas se entreteu com seus afazeres.

Mas por onde anda Lucy, quando não está com ABI?

Lá do outro lado da cidade na vila se São Vintém existe um bosque, com uma fonte de água cristalina, árvores grandes e pequenas, com bichos grandes e pequenos, com cheiros fortes e fracos, com frutas doces e amargas, com a luz do sol e a sombra da noite, um lugar nem bom nem ruim, um lugar de vida e também de morte. Lá vive Lucy.

Lá perto da Vila de São Vintém, também mora aquele menino, o Paulo Cesar que resolveu sair de casa sem pedir permissão a sua mãe. Paulo Cesar se perdeu lá pras bandas do bosque, Paulo Cesar queria encontrar aquela fruta doce perto do riacho em que seu irmão foi outro dia. Uma frutinha vermelha, cheirosa e suculenta. Mas Paulo Cesar não encontrou a frutinha, ficou perdido e assustado e quem o encontrou foi a Lucy.


- Olá garotinho. O que está fazendo aqui?


Com aquele olhar assustado que as crianças perdidas têm, conquistou o coração de Lucy. E assim, Paulo Cesar e Lucy começaram sua amizade. Lucy também abreviou o nome de Paulo Cesar para PC. Segundo ela, tudo fica mais fácil com um nome pequeno.

A partir de então os dias de Lucy eram com PC, quando ela o levava para casa, ia passar as noites com ABI.

ABI passou a saber das aventuras de PC no pequeno bosque através de Lucy. PC agora não se assustava mais, junto com Lucy ele aprendeu a explorar os campos, as nascentes e as cachoeiras, experimentou outras frutas, sentiu os cheiros e até tocou na pele de um coelho, tudo isso despertou em ABI uma curiosidade enorme em conhecer PC, o bosque de Lucy e poder conversar, contando para ele tudo que vivia e conhecia em seu mundo.

PC também ouvia as histórias sobre ABI, como ela aprendeu inglês ouvindo música em seu quarto de brinquedos, como ela enterrou sua caixa de segredos no jardim, e plantou as sementes da alegria num vaso chinês de sua mãe, tudo através de Lucy.


Até que um dia/noite todos se encontraram e passaram a conviver numa amizade de aventuras, brincadeiras no rio, e principalmente companhia e convivência. Num aprendizado de vida em contato com a natureza, e trocas ricas de possibilidades e felicidade, até porque felicidade são breves momentos cultivados na infância que duram para sempre em nossos corações e na memória, para que quando adultos possamos nutrir nosso dia a dia de lembranças.

 

Chegamos aqui para falar de “transtorno de déficit de natureza”. É assim que o pesquisador norte-americano Richard Louv define, no livro “A Última Criança na Natureza”, o que muitas crianças de hoje em dia estão vivendo, confinadas em microapartamentos e com pouco tempo dedicado ao brincar livremente.

Segundo Louv, “A natureza – o sublime, o inclemente e o belo – oferece algo que a rua, a comunidade fechada ou o jogo de computador não têm. A natureza apresenta aos jovens algo muito maior do que eles são e oferece um ambiente onde facilmente contemplam o infinito e a eternidade.”

O autor enfatiza que muitos são os problemas de aprendizagem, que compõem a dificuldade de concentração, a hiperatividade, o déficit de atenção, os transtornos emocionais e comportamentais que conectam-se diretamente ao pouco tempo que as crianças passam em contato com a natureza. Além é claro, dos problemas de saúde física e mentais, como obesidade infantil e síndrome do transtorno bi-polar.

Observando isso resolvi criar este conto de fadas para através do lúdico tocar o assunto isolamento social, extremamente delicado, mas de grande relevância dentro do contexto educacional. Quero também indicar livros que são um bálsamo em tempos difíceis de quarentena.


LIVROS QUE NOS TRANSPORTAM PARA A NATUREZA.


1. “Terra de Cabinha” (Peirópolis)


O livro da jornalista e pesquisadora Gabriela Romeu traz um inventário das infâncias do sertão do Cariri cearense. Além de mostrar como os meninos de lá brincam com muitos recursos, soltos na imaginação e na brincadeira livre, sugere uma série de ideias de brincadeiras típicas da região, apresentadas pelas próprias crianças que participaram da confecção do livro – elas contam o que é uma por uma e ensinam como brincar. O menino Jacaré, por exemplo, mora na Vila Lobo e brinca de “Estrelinha nova sela”, “Unha de gavião” e “Amassa tomate”. O projeto gráfico é um deleite à parte, com fotos de Samuel Macedo e ilustrações de Sandra Jávera. Dá vontade de sair brincando por aí.


2. “Reinações de Narizinho” (Biblioteca Azul)


Que é um clássico de Monteiro Lobato, quase todo mundo sabe. Mas nem sempre paramos pra pensar no quanto essa narrativa cheia de aventuras ao ar livre estimula o livre brincar. O escritor traz elementos conhecidos pelas crianças – paisagem, vegetação, animais e folclore – para recriar um mundo que só pode existir na imaginação. Sensorial e descritivo, é um livro para estimular os pequenos a viver um pouquinho mais parecido com os heróis da história, Pedrinho, Narizinho e a boneca falante Emília, em meio a jabuticabas e formigas-ruivas do sítio do Picapau Amarelo.


3. “Papai esteve na floresta” (SM Paradidático)


“Um dia, papai me contou que tinha estado em uma floresta que é mãe de todas as florestas, com árvores tão altas e grossas que para abraçar uma precisaríamos juntar todas as crianças da classe e, ainda assim, não conseguiríamos”. Quem narra essa história é o menino Theo, impressionado pelas aventuras do pai, que se embrenhou na floresta amazônica equatoriana para estudar uma ave muito rara chamada harpia. Assim, ele conhece pela imaginação as histórias de aranhas gigante, rãs cantoras e vagalumes, e entende que a floresta é a casa de milhares de seres vivos que, como ela, morrem e renascem. Uma lição sobre respeito à natureza e humildade diante do desconhecido. O livro de Gusti e Anne Decis é dedicado a todas as crianças da comunidade amazônica de Záparo visitada para contar essa história.



4. “Uma história guarani” (Edições SM)


Para os índios guarani, a aranha é o animal mais sagrado do mundo. Quando um bebê nasce, a mãe o protege dos insetos com uma delicada teia de aranha, que, segundo a sua crença, podem curar até feridas. Este livro, escrito e ilustrado pela uruguaia Alicia Baladan, conta a história de um jovem guarani que resolve sair em busca do precioso fio para presentear a namorada, mas se depara com os mistérios implacáveis da floresta. Trata-se de uma história mitológica e repleta de simbologias e metáforas no texto e na imagem. Belíssimo do ponto de vista gráfico, o livro faz pensar sobre a insignificância do ser humano diante da natureza.


5. “Dia de Sol” (Jujuba)


Do escritor e ilustrador Renato Moriconi, o livro faz uma narrativa visual sobre os ciclos naturais que recomeçam a cada dia. Um sol que aparece e desaparece. Esconde-se nas flores, equilibra-se na linha do horizonte, brinca de pega-pega e depois vai dormir. A partir dessa história que pode ser a narrativa perfeita do cotidiano de todos nós, o livro estimula nos pequenos a noção de que tudo é processo, percurso e tempo de espera. Quando as coisas escurecem, é preciso ter paciência até o próximo amanhecer…


6. “Antes Depois” (WMF Martins Fontes)


Livros que são verdadeiras obras de arte: este é certamente um deles. Matthias Aregui e Anne Margot Ramstein apresentam às crianças os ciclos naturais, onde o tempo de cada coisa interfere nas estações do ano, no brotar de um fruto e até na cor de uma flor. Com páginas duplas, em que a primeira representa o “Antes” e a segunda o “Depois”, tem noite que vira dia, semente que vira árvore, abóbora que vira carruagem. Com algo tão simples quanto mostrar uma geleira logo após uma floresta, o livro faz pensar em ancestralidade e estimula nas crianças o respeito pela natureza.


7. “Onde vivem os monstros” (Cosac Naify)


O clássico infantil de Maurice Sendak atravessa os tempos sem se restringir a uma faixa etária predeterminada, encantando crianças e adultos na mesma proporção. A história de Max, que foge de casa depois de se desentender com sua mãe, se tornou uma metáfora do reencontro com o selvagem e a vida que existe para além dos limites do nosso quarto. “Onde vivem os monstros” é uma ode ao natural, tanto no mundo externo quanto dentro de nós, já que sempre podemos libertar nossos monstros e enfrentar nossas próprias florestas misteriosas.


8. “Erumavez… umapessoaqueouviamuitobem” (MK Cultura)


Escrita pelo músico e educador musical Carlos Kater, a história conta a aventura da Pessoaqueouviamuitobem numa mata rica em cantos de animais e sons da natureza, e nos propõe jogos de escuta, percepção, memória e reconhecimento, ampliando os territórios da escuta e da produção musical. Esta segunda edição digital, em formato PDF e bilíngue (português-inglês), conta com ilustrações originais da artista plástica Tatiana Clauzet. São duas novas versões: a literária, com a história ilustrada e o audiolivro; e a versão do educador, que traz ainda material de apoio, fontes de referência e CD com 52 faixas com atividades e jogos sonoro-musicais.


* As descrições sobre cada livro foram elaboradas a partir de material disponibilizado pelas próprias editoras. E omiti propositalmente as ilustrações de cada livro, para que parte da aventura de ler, seja também buscar mais referencias sobre o tema escolhido.


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